domingo, dezembro 02, 2007

Lábios emprestados


Ando a beijar os lábios de um anjo. Um ser de aura branca e olhos vítreos. Beijo-o por escassez dos lábios que realmente quero provar.
O anjo sabe que os meus beijos não são dele mas de outrem. Mas sendo um ser celestial não se importa e reparte a sua alma comigo.
Terno e meigo, partilhamos momentos só nossos, longe de olhares inquisidores mas não são dele os lábios que me beijam a alma por inteiro. Essa boca, a que me eleva e guia ao céu, não é a de um anjo mas a de um cometa. Como tal, raras são as vezes que tenho a fortuna de o ver, parar a sua órbita e, juntos, tornarmo-nos corpos celestes.
Morfeu é perverso. Quando me permite algum repouso mina-me os sonhos com fantasias divinas em que, também eu sou fenómeno astronómico. Um qualquer pólo oposto do cometa e, obrigados pelas leis da física, unimo-nos numa explosão cósmica que desalinha os planetas e abala o universo.
E o anjo? Tenta com todos os seus poderes imortais levar-me às nuvens mas falha redundantemente o seu objectivo deixando-me apeada enquanto voa novamente para o seu cantinho no paraíso. Sinto o estremecer do seu corpo, o desembrulhar das suas asas, os seus braços à volta da minha cintura e a descolagem suave. Ensaia alar-me e levar-me com ele vezes sem conta, mas depois lê nos meus olhos que pertenço ao cometa e a força do seu abraço desvanece. Voa sozinho, mais uma vez. Talvez para a próxima…
É triste. Um melodrama de um anjo que quer cair para me ter. Guarda as tuas asas meu anjo, enquanto isso, peço os teus lábios emprestados…

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