sábado, março 15, 2008

A cara tem cara?

Não sei se foi intencional pedir-me que fosse ver a peça. Não sei se percebeu de antemão as sensações que me iria provocar… Estado febril e débil tudo pareceu encaixar…
A intensidade do monólogo… Os gestos exacerbados… A dor espelhada no espelho…
Os cadernos de memórias e as frases espalhadas - pistas de como viver a vida… Onde? Entre os livros, claro… O legado que lhe foi possível deixar nos momentos que “estava presente”… Filha de professora que questionava tudo utilizando jogos de palavras inteligentes para demonstrar como por vezes simplesmente não se entende o funcionamento do mundo. Falhou a professora ao tentar ensinar a filha a viver…
Os foguetes no peito e o frio do fim da tarde… A revelação final em jeito de “Aparição” de Virgílio Ferreira… Ela era o reflexo da mãe… Aquilo em que, ultimamente, a mãe não queria que ela se transformasse…
Também ela, com o tempo, teve a necessidade da mãe de se “ausentar” e, mimicando o gesto que viu vezes sem conta, dava de beber à dor que não era a dela, mas a deixada com herança pela figura materna. O esforço de tornar a filha melhor e maior que ela própria. Torná-la forte e destemida. “Faz o que te digo, não faças o que faço”… Invariavelmente, iremos fazer o que vimos ser feito e repudiar o que são apenas palavras sem acção ou conteúdo.
As horas… Disse-me ele, em tempos, que existe um tempo certo para cada coisa… Serão então horas…
As vinganças da criança que apenas e só queria ser isso mesmo, uma criança. Os lençóis, a roupa, a carpete, as pinturas desarrumadas no piso proibido. Desfazer rapidamente o mal que lhe soube tão bem para depois “arrumar a cara”… A cara tem cara?
À Sofia digo apenas: os anjos não têm costas…

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